LASCÍVIA

LASCÍVIA

LASCÍVIA

Os sudários fremem com a brisa a adentrar as persianas,
Aquecendo-os nas trempes com as caldeiras negras;
Dentre as caldeiras, plantas e flores, num aroma mágico,
As vestias úmidas pelas poções transluziam alvas sedas.

Insinuando os sinuosos corpos róseos das damas;
Jovens felizes com lindas açucenas nas cabeças…
Faltara pouco para as meninas tornarem-se amas,
E num rito de amor, despir-se ao luar para que o anjo padeça.

Dentre o vergel altivo as peles brilham mais,
Sob a lua tão cheia, que almeja ser mulher;
E o círculo místico torna-se a arena dos encantos,
Levando os errôneos patriarcas aos prantos.

Nos toques mais belos do amar,
Nas bocas intumescidas a calar,
E colarem-se, fazendo a pira queimar…
O círculo purifica o sangue inquisitivo.

E as crianças amadurecem em sibilas
Aos olhos do oráculo Selene, perfeição divina,
Filha da noite e do dia, com os olhos safira o mar das santas ilhas.
Ela reina ao centro, e colhe cada menina.

A última será a escolhida, a dona dos rumos,
Dando vida, a vida da noite;
No fremir das mandoras, vanescem-se os açoites,
As harpas cantam, e as fadas inundam o chão com húmus.

Nos suspiros do jorrar das águas, como se soubessem;
Oráculo inicia e acolhe o santo fruto,
Tão doce, que até os deuses por inveja chamam o luto.
E o ósculo é dado, e pelas águas os corpos descem.

Na dança dos corpos, tudo é infinito,
Os seios um só seio,
As bocas uma boca,
E o sexo, é único e mais bonito…

— Mas o que é permitido? O desejo é latente…
Assim os pássaros renascem e as flores vêm veementes;
E nada existe, senão as lembranças,
Sonhos vãos das ninfas, que dormiram crianças.

(Anderson Delano Ribeiro – 2005)

 

(Foto de Pedro Dias no Pexels)
ELEGIA ERRANTE

ELEGIA ERRANTE

ELEGIA ERRANTE

Quem és tu, que vieste dos ermos
Campos da aleia divinizada?
Amavios dantescos de um destino atroz.
És altíssima, minha tênue musa teologal;
Dona dos meus cândidos cânticos.
E contrito, peço-te clemência,
Por este, o santo afeto que me condena.
Não penses que minha ausência é fruto de frieza;
Menina de derradeiros devaneios do meu âmago.
Alado anjo do meu gótico altar-mor;
A misticidade e o poder teu, em minh’alma vã;

Destorva-me o siso, da sina de minha vida de vã.
Eu quero que vivas dentre toda a eternidade,
Proteger-te do mundo, e de mim…
E segredar minha paixão nas entrelinhas,
Eu surgi de um pedido às estrelas,
Vim das límpidas lágrimas cristais de um coração;
Pena eu ser tão efêmero… Como um sonho bom.
Volto ao meu lugar devido,
De onde eu nunca deveria ter saído.

Logo eu partirei, num albor especial,
A primavera me arrebatará,
E seguirei o caminho que meu pai mandar;
Tu ficas, ficarás eterna em minha mente;
És minha aura resplandecente,
A força que tiro da dor do meu voto.

Não consigo sentir desamor algum por ti,
E me entristeço, pois tu —
Vives para o mundo e não para mim,
E eu, vivo para o puro nada…
Anjo que estás em mim, protegendo e esmorecendo,
Não te quero mais, não mais!
Não sou devoto dos teus cantos,
Devoção é chama que destrói.
Amar-te foi fraqueza, nunca ames por amar;
Tu não me amas tanto, para votar-te tanto pranto.
E eu enclausurei na masmorra da dor,
A dor que os tolos chamam de amor.

Eu serei agora o poeta de alma morta,
O poeta de coração vazio;
O lúgubre poeta, amado da princesa Morrigan,
Ninfa, anjo sem asas e guia dos que partem.
Esta que me ama, e em breve me enviará ao empíreo;
A dama que em fúria é clamada por morte!
Mas antes que eu parta na gôndola dos dias,

Quero tentar descobrir-lhe o manto, a Vida!
E tocar-lhes as langues espáduas frias…
Pois para a Vida tudo é efêmero,
As pessoas, as riquezas, as cores e os amores,
Restando apenas o bálsamo, amor das almas;
A chama que freme louca, e não se apaga;
Pois minhas frases errôneas, são adornos –
Da louça de Deus…
E piram nas translúcidas chamas da poesia;
E nem a vida, nem a morte nem o nada,
Sufocam o amor e o ódio que habitam
Estes versos meus.

(Anderson Delano Ribeiro – 2005)

 

(Foto de Mehmet Aytemiz no Pexels)
LICITUDE

LICITUDE

LICITUDE

Às vezes acho
No encontro dos teus cachos
Um aroma de vida
Que por ventura perdida

Se encontra em meu olhar,
Na curva jamais esquecida
Entre o beijo, riso e o seio teu,
O turvo, desvaneceu

Com suas ondulações
Cacheadas e corpóreas em mim,
O tempo te fez mulher das águas!

Das ondas e ondulações do mar,
Eu canto para que inunde meus lábios,
Tu que és mar, navegue-te imensamente

Vésper coral em pétalas de manhã
Serena, risonha e transbordante
com hálito de hortelã.

(Anderson Delano Ribeiro – 2019)

 

(Foto de Thuanny Gantuss no Pexels)
SONETO QUESTÃO

SONETO QUESTÃO

SONETO QUESTÃO

Carece então
a questão?
Dá para sentir
saudades do futuro?

O presente pretérito
do absurdo…
Uma presença
na ausência,

O desejo incessante
do porvir!
O beijo em sentença!

Arde no peito,
Ardilosa candura
De saudades tuas.

(Anderson Delano Ribeiro)

 

(Foto de Lucas Meneses no Pexels)
CANTA PÁSSARO

CANTA PÁSSARO

CANTA PÁSSARO

O pássaro chora triste,
Numa dor que assim persiste;
No entardecer de mais um dia,
A canção não vem tardia;

Vem chorosa e glamurosa,
A canção tão poderosa;
É mais que um parto,
É uma dor que não tem jeito,

Vem latente assim do peito;
Vem da quase morte,
É uma estranha sorte.

Canta ó pássaro, e chora mais,
Feliz com sua tristeza,
Fecha os olhos, e sente a paz.

(Anderson Delano Ribeiro – 2005)

 

(Foto de Dilson Santos no Flickr)
LILYTH

LILYTH

LILYTH

Flui dos sonhos, ó ninfa em súcubo;
Na noite já tardia,
Das brumas te descubro;
Toca-me a tez em fantasia,

Mística, doce, em vão orgia;
Na ara flébil sinto teu dorso,
Danças leve em poesia,
Rosa Sacra, eflúvio em gozo.

Rasga-me o peito com um espinho,
Meu sangue faz-se o acre vinho;
Tantálicos, edênicos, efêmeros,
Como os álacres sonhos de Eros.

Musa minha de onire atroz,
Voltas a tua realidade,
Tênue, sutilmente, em nós
Restará a poética insanidade…

E d’instante eu desperto,
Dentre os templos de alabastros
E turíbulos de morfina. Onde estou?!
Ouço apenas o vento flébil cantar-me então…

Sussurros vãos que vem e vão,
Misticidade medonha,
Vesânia de quem sonha;
Cantas teu nome: Lilyth!

— Diz a mim tua confissão…

(Anderson Delano Ribeiro – 2005)

 

(Foto de Sadoc Ixtlahuaca no Pexels)
ZÉJEL N°06 (DOCE MORFINA)

ZÉJEL N°06 (DOCE MORFINA)

ZÉJEL N°06 (DOCE MORFINA)

Neste infinito estirão em que o vento,
Parece desafiar a luz efêmera dos tempos;
Poucas serão as belezas até o templo;
Em que as desgraças da vida parecem constantes.

E uma ninfa é ansiada para um breve instante,
Com as lâminas afiadas de uma asa cortante;
Ou qualquer salácia de um anjo bacante;
Aguardo teu tépido beijo de menina.

O sinal de uma profecia divina;
Comédia aos deuses que aos românticos fascina,
Desejando-te menina morte ou doce morfina;
Pois não há beleza-mor até o intangível templo.

(Anderson Delano Ribeiro – 2005)

 

(Foto de Pitt Rom no Pexels)
ROSA & CRUZ

ROSA & CRUZ

ROSA & CRUZ

“Santa Luz, que se apaga ao santo ofício,
Nas piras do ódio sacramentado…
Renascendo do amor, ágape-mor,
O santo Graal dos inocentes…”

Inicia-se mais um ciclo da lua,
No céu púrpura;
E a sibila dança no círculo desnuda, pura,
Embebeda-se nas alvas sépalas como a pele sua.

Na noite eterna,
Nos amavios de Gaya,
Com suas irmãs, paixão materna;
O ciclo da vida desagua na praia.

O oráculo não tem nome,
Apenas luz, iluminada criança alada,
Rosa e Cruz, anjo que a todos seduz;
Pureza indigna ao homem.

E quando a lua pira a chama rósea,
Ela impera nos empíreos místicos,
A vésper rosiclair dos negros céus,
Vem lasciva ao círculo, dançar com o manto véu.

Alegremente a marfar os Deuses do ódio,
Num ritu de amor e vida,
Inebriando os seres com seu santo ópio;
As filhas de Diana estão de partida…

Vens com os sonhos do Segrel noturno,
Da pira erradia do Santo Ofício;
“O mal do homem, é o homem…”
E nos zéfiros se vai, quão pó de estrelas.

Na certeza de um breve retorno,
No pojar, da lua rósea da primavera,
Com suas crianças a brincar desnudas na chuva,
Com os sudários ao chão em círculo como adorno.

Surgindo do Prisco céu lucipotente,
Deixando os males totalmente impotentes;
Esvanecendo Crás…
Eternizando Hodie!

Rosa e Cruz com sua xamata estrelada,
E os pomos lúridos a alimentar as alcateias;
Luzindo o Segrel em sua estirada,
Dando vida à morte!

Com seus cantos de soprano ao luar,
Com os pássaros, ciranda a voar;
Inundando os corpos com orvalho,
O néctar divino, as lágrimas de uma mãe.

E na dança do universo,
As fadas plantam Akasha com os lábios,
Doce amor fremente – Quantum Satis!
Aos cantos, encantos de um desejo secreto.

Sobrevivente à chama das mentiras,
Num claustro templo de ocultas orgias,
“Deus nunca viveria lá…
Prédios são templos ao pseudodeus homem.”

Deus talvez fale através dos pássaros,
E sua face nos olhe num dia de sol;
As estrelas, anjos dos altos ermos.
Habitando a alma de quem crê neles.

A justiça dos homens se difere da divina,
Pois no céu púrpura brilha a rosa menina;
Renascendo nas noites lúbricas de lua,
Num círculo de véstias e peles cruas.

Suas crianças brilham como Ela,
E cantam felizes, num mágico ritual,
Dentre pequenas estrelas de sal
Os corpos tão belos com sépalas de Hera.

E o poder exalado das acácias azuis,
Faz vibrar o céu, em gotículas de cristais;
Luzindo os seios nus;
Magia das fadas, justiça divina.

Rosa e Cruz, luz no céu púrpura,
Iluminando os magos e profetas;
Nos sonhos e paixões da vida,
Ilumina suas meninas e seus jovens poetas.

(Anderson Delano Ribeiro – 2005)

 

(Foto de Marlon Schmeiski no Pexels)

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