LASCÍVIA

Os sudários fremem com a brisa a adentrar as persianas,
Aquecendo-os nas trempes com as caldeiras negras;
Dentre as caldeiras, plantas e flores, num aroma mágico,
As vestias úmidas pelas poções transluziam alvas sedas.

Insinuando os sinuosos corpos róseos das damas;
Jovens felizes com lindas açucenas nas cabeças…
Faltara pouco para as meninas tornarem-se amas,
E num rito de amor, despir-se ao luar para que o anjo padeça.

Dentre o vergel altivo as peles brilham mais,
Sob a lua tão cheia, que almeja ser mulher;
E o círculo místico torna-se a arena dos encantos,
Levando os errôneos patriarcas aos prantos.

Nos toques mais belos do amar,
Nas bocas intumescidas a calar,
E colarem-se, fazendo a pira queimar…
O círculo purifica o sangue inquisitivo.

E as crianças amadurecem em sibilas
Aos olhos do oráculo Selene, perfeição divina,
Filha da noite e do dia, com os olhos safira o mar das santas ilhas.
Ela reina ao centro, e colhe cada menina.

A última será a escolhida, a dona dos rumos,
Dando vida, a vida da noite;
No fremir das mandoras, vanescem-se os açoites,
As harpas cantam, e as fadas inundam o chão com húmus.

Nos suspiros do jorrar das águas, como se soubessem;
Oráculo inicia e acolhe o santo fruto,
Tão doce, que até os deuses por inveja chamam o luto.
E o ósculo é dado, e pelas águas os corpos descem.

Na dança dos corpos, tudo é infinito,
Os seios um só seio,
As bocas uma boca,
E o sexo, é único e mais bonito…

— Mas o que é permitido? O desejo é latente…
Assim os pássaros renascem e as flores vêm veementes;
E nada existe, senão as lembranças,
Sonhos vãos das ninfas, que dormiram crianças.

(Anderson Delano Ribeiro – 2005)

 

(Foto de Pedro Dias no Pexels)